terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

A Democracia, a Europa e os Jovens

O CFC, no âmbito da sua Unidade de Cooperação Internacional, está a desenvolver várias candidaturas ao Programa Comenius, visando a mobilidade de Docentes e Discentes. Uma dessas candidaturas envolve outros três países - Turquia, Alemanha e Polónia. O tema aglutinador é "Democracia - Um Passo para o Nosso Futuro Comum".
Enquanto estava a trabalhar nela, reflectia em várias situações:
a) Há alguns anos tive alguma dificuldade em explicar a um familiar adolescente o conceito de Cidadania: quando lhe dava exemplos práticos, ele olhava para mim com ar espantado, tendo acabado por admitir que para ele, tudo aquilo que lhe estava a dizer era óbvio! Concluí, por isso, que além de péssimo explicador, não sabia se havia de ficar triste ou satisfeito - afinal, esta nova geração já tinha interiorizado de tal forma conceitos como votar, participar em acções cívicas (ambientais, por exemplo), debater livremente com os amigos temas do seu interesse e exprimir as suas opiniões, ..., que já nem sequer reflectia como haviam chegado a eles.

b) Actualmente nota-se (em conversas, em reportagens) um desinteresse dos jovens sobre as grandes questões do País. Porém, até que ponto, enquanto Escola, conseguimos motivá-los para essas questões? Recordo-me de quando dava formação em cursos de Aprendizagem me pediram para ministrar um módulo de "Mundo Actual"; solicitei o programa e deram-me apenas linhas de orientação, pois o objectivo era colocar os formandos a reflectir sobre a actualidade. Conversei então com eles e acordámos em dividir a turma em grupos; cada grupo tinha então de preparar um curta apresentação à turma cada duas aulas sobre uma notícia escolhida nas primeiras 10 páginas de um jornal diário ou semanário à sua escolha (de entre os tidos como "de referência"), ou em alternativa dos primeiros 15 minutos de um noticiário televisivo. Assim, numa aula eles pesquisavam o enquadramento, reflectiam criticamente sobre o que ouviam e apresentavam à turma na aula seguinte, sendo avaliados também pela capacidade de responder às perguntas que os colegas lhes faziam. Sendo um módulo peculiar e manifestamente menorizado pelos outros formadores, foi com enorme satisfação pessoal que no decorrer de um conselho pedagógico o representante dos alunos disse, a respeito da reprimenda que o Coordenador lhes estava a dar, que grande parte dos módulos "era uma seca, porque os stôres não conseguiam explicar para quê é que aquilo servia. Ao menos no de Mundo Actual é animado, porque somos nós que damos as aulas! Já percebo o que é o défice [já nessa altura...] e porque é que ele pode ser tão importante para o nosso futuro - o meu pai vai pagar mais impostos, o que significa menos dinheiro lá em casa, e lá se vão as férias!". Apesar de simplificação minimalista, achei que ele tinha percebido o núcleo da "coisa", e senti-me realizado pessoal e profissionalmente. Hoje sei que os jovens, pelo menos na disciplina de Integração do Ensino Profissional, trabalham estes assuntos com eficiência.

c) Um dos aspectos que me anima é o facto de os jovens, enquanto em trabalho de grupo, quando não obtém consenso, votam. Assumem um dos pilares da Democracia inconscientemente! Não confundir, porém, com votação em eleições: se muitos dos adultos não conseguem distinguir as propostas dos principais partidos, não lêm os respectivos programas (diga-se em abono da verdade que dos que já li a esmagadora maioria eram genéricos, constituindo uma panóplia de intenções ao invés de objectivos claros e quantificáveis, e algumas dessas intenções irrealizáveis, por utópicas (ou pelo menos como Sir Thomas More as veria...), a maioria dos jovens não se sente atraído por questões que não lhe são explicadas de forma clara. Porém, assisti a conversas muito inflamadas aquando do Referendo sobre a Interrupção Voluntária da Gravidez, que, independentemente do lado, me fizeram sentir satisfeito: eram sérias, fundamentadas, correctamente balizadas.

Esta dissertação já vai longa. Queria sobretudo deixar uma mensagem de esperança que esta candidatura seja aprovada, para que alguns dos nossos alunos possam ir conhecer realidades europeias completamente diferentes das que estão habituados e no regresso reflictam criticamente sobre elas.
Por exemplo, a importância do Papa João Paulo II na queda pacífica do regime polaco do General Jaruzelski - quando recebeu a delegação do Sindicato Solidariedade e lhes disse as célebres palavras "Não tenhais medo!".
Por exemplo, a importância da separação entre Estado e Religião, imposta por Kemal Ataturk, pai da República Turca e seu primeiro Presidente, cujo legado é ainda hoje vital para se perceber as tensões entre a Turquia pró-Europa e a Turquia contra a adesão, e todos os valores culturais envolvidos.
Por exemplo, a importância de a constituição germânica colocar tantas restrições quanto ao uso das Forças Armadas fora do contexto da NATO, no seguimento das imposições Aliadas do pós II Guerra Mundial.

Sérgio Fernandes

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